Centro Universitário Norte do Espírito Santo, São Mateus - ES

DASAS discute sobre Setembro Amarelo: Por um Setembro mais Saudável.

Estamos no mês de setembro, época em que as instituições, especialmente as de saúde, envidam esforços em campanhas para prevenção aos comportamentos suicidas na população. Convencionou-se chamar de Setembro Amarelo. Há alguns dias li uma matéria jornalista sobre o tema que me lembrou de uma discussão com um amigo ocorrida já faz anos. Dizia ele: “Não concordo com essa ideia de prevenção ao suicídio. Como se evita alguém de fazer o que já decidiu fazer?”

Era uma pergunta importante, pertinente. Uma que ainda hoje raramente vejo ser abordada adequadamente. Como se previne um ato feito por vontade própria? E este meu amigo, inteligente como é, usava sua experiência e treinamento de trabalhador industrial (peão, como ele prefere) para me lembrar que prevenção é um termo que remete a situações evitáveis, como acidentes. Assim, quando falamos de prevenção de acidentes de trabalho, estamos dizendo de um arcabouço de normas estabelecidas que, em resumo, obrigam às empresas a adequações de engenharia e aos funcionários ao treinamento e ao uso de equipamentos de proteção individual, sendo fiscalizados por órgãos competentes. Devidamente aplicadas as normas, o número e a letalidade dos acidentes diminui. Seria possível fazer algo análogo para um tipo de comportamento em que a pessoa é ao mesmo tempo agente e alvo?

Bem, a referida matéria tratava de 01 ano desde a conclusão das obras de ciclovia na 3ª Ponte, que liga o município de Vila Velha à capital Vitória/ES. Obra que incluiu proteção às bordas muitas vezes pleiteadas, mas até então inexistentes. E o que dizia a matéria? Que desde sua conclusão, já se comemorava também 01 ano sem nenhuma morte por suicídio por precipitação daquele lugar. As mortes que eram por volta de 10 ao ano, zeraram, e mesmo as tentativas que computavam mais de 100 anuais, caíram para algumas dezenas. Talvez você diga: “Sim, mas a pessoa só deixou de ir ali, mas deve ter feito em outro lugar.” Pois a matéria também indica que, segundo dados oficiais, essa presunção não pode ser feita automaticamente. É bem provável que um mero empecilho a mais tenha salvo vidas, facilitando o belíssimo trabalho dos socorristas que ali atuam, e que se tivesse sido feita antes a obra, vide reiteradas solicitações de especialistas, mais mortes teriam sido prevenidas.

Para responder completamente ao meu amigo (e a todos que tem tal questionamento) é preciso por em cheque a ideia de que o indivíduo, quando atenta contra a própria vida, está agindo por vontade própria. Consideremos outro exemplo: quando alguém consome bebida alcoólica e decide dirigir, e por acidente atropela alguém. O entendimento atual da lei e da maioria da população é que o indivíduo deva ser responsabilizado, não por ter escolhido atropelar ninguém, foi um acidente, mas porque assumiu o risco de acontecer acidentes ao beber e dirigir. Após estar bêbado, entendemos que seus atos já não são por vontade plena, sã e consciente. De forma análoga, pessoas que põem tentativas de suicídio em ação, não estão agindo de vontade plena e sã, pois geralmente agem num impulso por uma crise emocional intensa. É quase uma batalha entre o impulso de acabar com tudo e o de continuar acreditando e se agarrando à vida. Aliás, é exatamente por esse fator, por se tratar de atitude impulsiva, que jovens e adolescentes (com córtex pré-frontal ainda não totalmente formados) estão sob risco maior de morrerem por suicídio (além de mortes violentas e acidentes) do que adultos.

Que lições podemos tirar disto? Caso você esteja lendo este texto, provavelmente tem interesse no tema, seja porque tem contato com pessoas com ideação suicida na vida particular ou profissional, seja porque tenha ideação suicida. Talvez ambos. O principal conselho então é: procure ajude profissional! Não tenha medo, vergonha, culpa; não hesite. Profissionais treinados para acolhê-lo podem te orientar e te ajudar a encontrar saídas alternativas.

Além disso, cito algumas orientações gerais que imagino todos deveriam saber para lidar com tal situação. Com elas o número e a letalidade das tentativas de suicídio diminuem, segundo estudos. São elas:

• Não é falta de Deus. Ideação suicida pode acontecer com qualquer pessoa, mesmo as mais devotas, seja qual crença ou religião for. Caso a comunidade de fé/religiosa providencie sensação de pertencimento e socialização, orienta-se usá-la como estratégia para lidar contra a vontade de morrer. Mas caso seja um espaço de opressão, orienta-se buscar a espiritualidade de outra forma ou local.
• Diminuir acesso a elementos perigosos. Não cabe aqui discutir especificamente métodos diversos. Mas se a pessoa já pensou, verbalizou ou tentou com algum método específico, orienta-se dificultar o acesso a este. Qualquer barreira a mais pode ser o tempo suficiente para repensar a atitude, ou para diminuir a crise, e desistir. Travas, cadeados, se desfazer daquilo em casa, pedir que outro administre isto por você, …
• Facilitar acesso a amigos e a profissionais que possam ser acionados em caso de necessidade. Quem você pode contar em caso de uma dificuldade? Identifique 02 pessoas e coloque no status do celular como contatos de emergência. Há algum profissional que te acompanha? Deixe fácil o contato dele(a). Tenha salvo também no celular os contatos do CVV (188), do Serviço de Ambulância, do Corpo de Bombeiros e da Polícia.
• Estabeleça projetos para o futuro. Nem sempre a pessoa com ideação suicida é ausente de metas e objetivos, mas essa ausência pode influenciar negativamente em nossa autoestima. Projetar para o futuro, planejar, desejar, ajuda a criar motivos e vínculos para continuar vivendo.

Os profissionais da DASAS estão disponíveis caso você necessite conversar sobre este ou outros assuntos difíceis.

Principais referências:
• ZAGOTO, V. (2023). Índice de suicídios zera da Terceira Ponte após instalação de grade em ciclovia. In. A Gazeta Online. Vitória, 07/08/2023. Disponível em: «https://www.agazeta.com.br/es/cotidiano/indice-de-suicidios-zera-na-terc...»
• MENDES, JDV. (2015). Perfil da Mortalidade em Adultos por Faixa Etária e Sexo no Estado de São Paulo em 2013. In. Boletim BEPA: Saúde em dados contextualização. 12(143): pp.1-17.
• BOTEGA, NJ. (2015). Crise suicida: avaliação e manejo. Porto Alegre: Artmed. p.302.

 
Texto: DASAS
Tags: 
Transparência Pública
Acesso à informação
Facebook

© 2013 Universidade Federal do Espírito Santo. Todos os direitos reservados.
Rodovia Governador Mário Covas, Km 60 - Bairro Litorâneo, São Mateus - ES | CEP 29932-540